O envelhecimento no Brasil: panoramas e perspectivas

Existe a necessidade de conscientização da sociedade perante a nova condição dos idosos e de proporcionar a eles o lugar de destaque que merecem © Depositphotos

O estilo de vida da população modificou-se expressivamente nas últimas décadas, provocando aumento do sedentarismo, especialmente nos países industrializados.

Por Guilherme Stival
26 de maio de 2024 / Curitiba (PR)

A terceira idade baseia-se em pressupostos de que a pessoa já tenha realizado suas contribuições para a sociedade, estabelecido uma família, desenvolvido uma atividade profissional e chegado ao momento da sua plenitude, de viver a vida sem maiores responsabilidades. Entretanto, essas premissas têm maior relação com o momento atual em que se vive, já que algum tempo atrás não eram essas as condições que um idoso desfrutava.

Para aqueles que já atingem seus 30 anos de vida, é importante que nesse início de leitura façam uma rápida visita às suas lembranças. Como era a realidade de pessoas idosas na década de 1980? Se você não atingiu essa faixa etária, dirija-se a uma pessoa que tenha mais de 30 anos e pergunte a ela. Até por volta da década de 1950, os idosos eram reconhecidos como pessoas frágeis no sentido de atenção à saúde, pois a assistência médica era mais precária (havia inadequado saneamento básico, falta de planejamento ambiental, poucos avanços tecnológicos, científicos e medicamentosos) e desta forma necessitavam de mais cautela.

Os idosos realizavam mais atividades cotidianas, como tarefas domésticas, assistir à televisão, ouvir o rádio ou ler o jornal, mas também tinham atividades diferentes das executadas hoje. Naquela época, por exemplo, mesmo em centros urbanos, havia casas com grandes terrenos ou quintais com criação de animais e hortas, fazendo com que as pessoas em todas as faixas etárias praticassem atividades motoras de forma mais intensa. E pode-se referir também que havia uma larga escala de atividades motoras para subsistência na vida rural. Não havia, porém, a perspectiva que se tem atualmente de que o idoso precisa exercitar-se, praticar atividades com maior gasto energético durante o dia.

Mais estresse e sedentarismo

Os idosos da sociedade atual têm diferentes ações, pois as necessidades e questões culturais modificaram nosso modo de vida. São fatores como os avanços tecnológicos, a medicina com diagnósticos mais precisos e atenção à saúde idosa, avanços de acesso à informação e serviços, estudos sobre as condições do idoso, políticas de atenção ao idoso, instrumentos legais que protegem e amparam a população idosa e questões ligadas à segurança, entre outros.

O estilo de vida da população modificou-se expressivamente nas últimas décadas, provocando aumento do sedentarismo, principalmente nas pessoas que vivem em países industrializados. Estas mudanças ocorreram tanto no ambiente familiar, nos deslocamentos diários, quanto no ambiente ocupacional. A mecanização das indústrias, a revolução tecnológica e a informatização dos serviços trouxeram bons resultados para o capital das empresas, mas contribuíram para que as pessoas se tornassem mais estressadas e sedentárias.

Com a inserção no mercado de trabalho, os idosos dispõem de bom poder de compra e preferem usá-lo de forma independente, visto que os setores de turismo e atividades físicas cresceram muito nos últimos anos © ljsphotography / Depositphotos

Um ponto a ser destacado são as políticas públicas de atenção à pessoa da terceira idade. O envolvimento de outros países nas discussões sobre a população idosa, liderados pela Organização das Nações Unidas (ONU) com a Carta de Princípios para as Pessoas Idosas, valoriza o debate e principalmente a importância do tema. Neste documento, especificamente, são tratados assuntos referentes à participação, independência, autorrealização, assistência e dignidade das pessoas idosas como marcos fundamentais para as políticas públicas.

Estatuto do idoso

Outro marco que fundamenta essas políticas públicas de atenção à pessoa de terceira idade, porém em âmbito nacional, foi a criação do Conselho Nacional dos Direitos do Idoso (CNDI) em 2002 e a elaboração e publicação da Lei 10.74, sancionada no dia 1º de outubro de 2003. Também conhecido como Estatuto do Idoso, essa lei promoveu maior responsabilidade e preocupação com a população de terceira idade do País. A lei foi criada principalmente pelo reconhecimento de que um novo perfil social estava em crescimento no Brasil.

O envelhecimento deixa de ser uma questão privada, de responsabilidade da família, e passa a ser uma condição social que envolve diversos atores da sociedade. O idoso passa a ocupar espaços sociais que anteriormente não ocupava e, com isso, a necessidade de a sociedade reconhecer a pessoa de terceira idade e inserir o idoso nesse contexto.

O Estatuto do Idoso assegura garantias a toda pessoa que tenha 60 anos ou mais. Em aspectos gerais que merecem destaque e que fazem relação direta à maior incidência das estatísticas nacionais, é a efetivação de direito a saúde, alimentação, educação, cultura, trabalho, dignidade, respeito e convivência familiar e comunitária.

“Com esse breve panorama mundial que terá reflexos em todas as sociedades, além das constantes modificações evolutivas sofridas nos últimos anos principalmente com o advento da tecnologia, os governos serão obrigados a rever políticas e ações que tenham incidência na sociedade em geral.”

Dos pontos citados, a atenção à saúde por meio do Sistema Único de Saúde (SUS) auxilia bastante a melhoria de condições de saúde do idoso. Outro ponto relevante é o acesso ao trabalho, já que mesmo para aposentado existem políticas de contratação e incentivo ao retorno ao mercado de trabalho.

Um último ponto a ser considerado são as políticas de atenção a idosos que não possuem proventos e recebem do governo, por meio de programas assistenciais, recursos para sua subsistência.

Esses três aspectos citados podem ser destacados como emancipadores da população de terceira idade e promotores da evolução das estatísticas dessa população em nosso País.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em parceria com a Secretaria de Direitos Humanos, no ano de 1990, considerando pessoas acima de 60 anos, a população idosa no Brasil atingia a marca de 10,7 milhões de pessoas. Dez anos depois, em 2000, a população de idosos crescia aproximadamente 71% e atingia a marca de 15 milhões de pessoas. Já no último censo realizado em 2010 a população de terceira idade chegava à marca de 20,5 milhões de pessoas, representando 12% da população. Em 2022 atingiu-se a marca de aproximadamente 32,1 milhões de pessoas. O aumento comparado ao ano de 2010 é de 56%. As regiões Sudeste e o Sul tinham estruturas mais envelhecidas: 12,2% e 12,1% da sua população tinham 65 anos ou mais de idade, respectivamente. A idade mediana da população brasileira aumentou seis anos desde 2010 e atingiu os 35 anos em 2022.

1 bilhão de idosos em 2050

É nítido que a população aumenta gradativamente e as projeções futuras acompanham esse crescimento. Segundo estimativa da ONU com o Fundo de Populações, uma em nove pessoas do mundo tem acima de 60 anos de idade atualmente. Em 2050, prevê-se que ocorrerá um fenômeno inédito: haverá mais idosos do que crianças com até 15 anos de idade. Essa projeção mostra que o número de filhos que uma família pretende atingir vem diminuindo significativamente. Já não é mais comum uma família ter quatro ou cinco filhos. Atualmente, a pirâmide social vem reduzindo estes números, culminando em 2050 nessa estatística apresentada. Com isso, as projeções futuras remetem a dados de que a população acima de 60 anos alcance a marca de 1 bilhão de pessoas.

Os idosos da sociedade atual têm diferentes ações, pois as necessidades e questões culturais modificaram nosso modo de vida © Krakenimages.com / Depositphotos

Com esse breve panorama mundial, que terá reflexos em todas as sociedades, além das constantes modificações evolutivas sofridas nos últimos anos principalmente com o advento da tecnologia, os governos serão obrigados a rever políticas e ações que tenham incidência na sociedade em geral. Os dados apontam para uma mudança significativa na configuração e organização social e, sem dúvida, terá de alterar o comportamento diante dessas mudanças no mundo. Esse contexto é agravante e as mudanças devem ser rápidas e assertivas, em todas as sociedades. Os desafios são imensos, desde questões culturais, atitudinais e comportamentais.

Dentre essas mudanças, pode-se destacar que a maior parte dos idosos contribui hoje de forma significativa no orçamento familiar, exercendo papel estratégico na constituição financeira das famílias. Conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) contínua, o desemprego entre os idosos saiu de 18,5% em 2013 para 22% em 2022. Com estes números, inicialmente, percebe-se a queda do poder de compra e remuneração da população de terceira idade no País. Em seguida, pode-se identificar que boa parte da população pretende continuar no mercado de trabalho mesmo que conquiste sua aposentadoria.

“O que pode ser destacado é que a percepção de vida, longevidade e independência se fortalece entre os idosos. Em vez de pensarem no término da vida, muitos ainda querem conquistar novas situações e aproveitar ainda mais o tempo que lhes resta.”

Sobre seus gastos e a forma como decidem no que pretendem investir seus recursos financeiros, verifica-se um grande crescimento nos setores ligados a vestuário, turismo, atividades físicas, cosméticos compras pela internet e produtos (cosméticos e alimentação) ligados à terceira idade. Com essa inserção no mercado de trabalho, os idosos dispõem de bom poder de compra e preferem usá-lo de forma independente, visto que os setores de turismo e atividades físicas cresceram muito nos últimos anos, proporcionando a programação de viagens e/ou de atividades físicas, que antes eram comportamentos pouco assumidos por pessoas da terceira idade.

Quanto às suas práticas diárias, 71% deles avaliam sua saúde como boa ou ótima; 82% declaram ter o hábito de ler e 72% referem-se a escrever costumeiramente, enquanto 41% fazem atividades físicas. Estes dados indicam que há uma população de terceira idade ativa fisicamente e intelectualmente (Torquato, Massi, Santana, 2011; Ugalde, 2006).

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O que pode ser destacado é que a percepção de vida, longevidade e independência se fortalece entre os idosos. Em vez de pensarem no término de sua vida, muitos ainda querem conquistar novas situações e aproveitar ainda mais o tempo que lhes resta.

Portanto, partindo para as considerações finais deste capítulo, nota-se que o perfil da população de terceira idade mudou nas últimas décadas. Essas mudanças levam a novos comportamentos e maneiras de lidar com essa população. Seus anseios e expectativas são diferentes, logo, a maneira de viverem e expectativas que alimentam são totalmente diferentes.

Existe a necessidade de conscientização da sociedade perante a nova condição dos idosos e de proporcionar a eles o lugar de destaque que merecem, com todo o respeito e reconhecimento de suas trajetórias de vida, e proporcionar novas condições em sua existência. Essa conscientização, que permite reconhecer que os idosos de hoje são realmente diferentes dos idosos de décadas atrás, poderá atender seus anseios e proporcionar condições que até mesmos desconhecemos que são capazes.