17 de dezembro de 2024
Autor de denúncias contra o presidente do CREF22/ES cobra medidas punitivas
Ibsen Pereira já é alvo de processo judicial, mas as diretorias do CONFEF e do CREF1/RJ, responsáveis pela indicação, continuam indiferentes e o mantêm no cargo.
Por Paulo Pinto / Global Sports
21 de abril de 2024 / Curitiba (PR)
Um vídeo publicado no YouTube pelo professor Átila Rodrigues Linhares em 2020, com acusações de assédio sexual e pedofilia contra o professor Ibsen Lucas Pettersen Pereira, caiu como uma bomba sobre a comunidade judoísta do Espírito Santo. O fato levou a Federação Espiritossantense de Judô (FEJ) a convocar o autor das denúncias, testemunhas e vítimas a deporem num processo interno que culminou com o afastamento do acusado de qualquer relação com a federação e o encaminhamento de denúncia formal à Confederação Brasileira de Judô (CBJ) e ao Ministério Público estadual.
Tais acusações não impediram que recentemente as diretorias do Conselho Federal de Educação Física (CONFEF) e do Conselho Regional de Educação Física do Rio de Janeiro (CREF1/RJ) escolhessem Ibsen Pereira para presidir o recém-criado Conselho Regional de Educação Física do Espírito Santo (CREF22/ES). Inconformado, o conselheiro Angelo Luís de Souza Vargas levou todas essas informações à plenária do CONFEF, cuja diretoria se mantém indiferente e inerte.
Diante da falta de providências após acusações tão graves, procuramos o professor Átila Rodrigues Linhares, faixa preta go-dan (5º dan) e pós-graduado em judô e jiu-jitsu, que ratificou todas as acusações feitas no vídeo de 2020, deu mais detalhes sobre os acontecimentos e mostrou-se indignado com a inércia e falta de ética do CONFEF e do CREF22/ES.
“Acho que esse comportamento representa a total desmoralização das entidades. Ambas as diretorias estão autorizando seus pares a terem esse mesmo tipo de conduta e não serem punidos”, enfatizou o professor. “Vou mostrar as barbaridades que Ibsen pratica e, principalmente, o absurdo que está sendo promovido pelo CONFEF e pelo CREF22/ES, pois ambas as entidades operam com recursos públicos.”
Veja a seguir os principais pontos da entrevista do professor Átila Rodrigues Linhares.
Quando ocorreram os fatos imputados a Ibsen no seu vídeo? Que cargo ele ocupava na Federação Espiritossantense de Judô?
Acho que foi entre 2014 e 2017. Na época ele fazia parte da banca examinadora de avaliação para exames de faixa preta, da qual também participei algumas vezes. Uma das acusações que recaem sobre ele ocorreu em função do cargo que ocupava.
“Sem nenhum escrúpulo, Ibsen disse a ela que só conseguiria o benefício do PAF se tivesse relações sexuais com ele.
Que episódio foi esse?
Uma atleta da minha equipe, a Amanda Dutra, que viera de São Paulo e já havia representado o Brasil em eventos internacionais, fora campeã no brasileiro regional e tinha direito a receber recursos do PAF, programa de da Confederação Brasileira de Judô em parceria com o COB. Sem nenhum escrúpulo, Ibsen disse a ela que só conseguiria o benefício se tivesse relações sexuais com ele.
E o que aconteceu depois? Houve denúncia?
Obviamente ela recusou a proposta absurda e perdeu o benefício que havia conquistado nos tatamis. E, para agravar ainda mais a situação, ele deu a passagem que seria dela a um de seus alunos sem pontuação no ranking. Na época Amanda não o denunciou por medo de represálias, mas depois que se mudou para a Itália ela nos autorizou a revelar os fatos. O grande problema é que todas as pessoas que ele assediou o temiam, pois depois de algum tempo ele chegou a assumir a direção técnica da FEJ.
Houve outras ocorrências semelhantes?
Lamentavelmente sim. Uma promotora pública transferiu a filha dela, que estudava numa escola particular de Vila Velha, para o meu dojô, alegando que Ibsen teria mordido a coxa da menina. Sei que mais tarde foi aberto um processo criminal para apurar o incidente, que ficou um tempo engavetado e foi reaberto recentemente.
“A judoca Renata Lee o acusou de exigir que ela tivesse relações sexuais com ele para aprová-la num exame de promoção de faixas.”
Existem outras acusações contra ele?
Sim, e não são poucas. Houve uma menina que queria trabalhar com ele na universidade federal e o denunciou por assédio. A judoca Renata Lee o acusou de exigir que ela tivesse relações sexuais com ele para aprová-la num exame de promoção de faixas. Ela recusou e foi reprovada. Quando publiquei o vídeo no YouTube com acusações contra Ibsen fui procurado por Joana, uma faixa-preta que morava no Rio de Janeiro, que contou ter sido assediada por ele quando tinha apenas 14 anos. Na época ela ficou calada com medo que seus pais a proibissem de continuar no judô. Hoje ela é Profissional de Educação Física no Espírito Santo.
Como foi o incidente ocorrido nos vestiários?
Uma testemunha convocada pela Justiça contou que Ibsen tentou entrar à força na sala de pesagem feminina em evento da FEJ, sabendo que lá as atletas estariam nuas ou seminuas. Impedido, ele esbravejou que era professor graduado e diretor técnico da federação, causando tumulto e mal-estar. Mesmo assim foi barrado pelos funcionários.
Como a FEJ tomou conhecimento das acusações?
Os membros da diretoria da FEJ ficaram sabendo do vídeo que publiquei no YouTube e me convocaram. O vice-presidente da federação é promotor de Justiça e disse que teria de tomar uma medida contra o Ibsen, por tudo aquilo de que estava sendo acusado, ou contra mim, por estar atacando uma pessoa inocente. Os diretores me ouviram e ouviram outras pessoas, produziram um dossiê e o advogado da federação encaminhou a denúncia ao Ministério Público, onde o processo ficou parado por dois anos. Felizmente agora voltou a tramitar.
“Ibsen Lucas Pettersen Pereira também assediou moralmente um menino autista.”
Qual a situação agora?
Somente fui ouvido há um mês e pouco, numa delegacia que enviou todos os depoimentos ao Ministério Público. Ele também é acusado de assediar moralmente um menino autista, filho de uma Promotora de Justiça. Essa magistrada, aliás, é irmã do professor Paulo Wanderley Teixeira, ex-presidente da Confederação Brasileira de Judô e atual presidente do Comitê Olímpico do Brasil (COB).
Como você avalia a postura da diretoria da FEJ?
Correta e condizente. Agiu de forma absolutamente correta ao suspendê-lo de toda e qualquer atividade oficial do judô dentro do Estado do Espírito Santo.
A FEJ comunicou o caso à Confederação Brasileira de Judô?
Sim. Mas surpreendentemente a CBJ não aplicou nenhuma medida disciplinar.
“Crianças foram vítimas de um sujeito absolutamente desqualificado e despreparado para exercer sua função, seja como pedagogo, seja como sensei.”
Como você avalia o dano causado a essas meninas assediadas por ele?
Que eu saiba nenhuma largou o judô imediatamente, mas a imagem da modalidade foi destroçada para todas estas famílias. Ele atacou crianças que vieram para o judô encantadas com a proposta do nosso fundador, sensei Jigoro Kano, que pautou a prática em princípios como o jita-kyoei e o sei-ryoku-zen-yo, e para aprenderem a ver a vida sob outra perspectiva. E foram vítimas de um sujeito absolutamente desqualificado e despreparado, para exercer sua função, seja como pedagogo, seja como sensei.
Você era amigo do professor Ibsen Lucas Pettersen Pereira?
Há muitos anos fui convidou para integrar uma importante equipe de judô, como professor e competidor, pois eles precisavam de um atleta mais experiente. Com isso a equipe saiu da 16ª colocação para ser campeã estadual. Ele fazia parte dessa equipe, mas eu já o conhecia há muito tempo, pois fora meu aluno até a faixa verde. Hoje a graduação dele é igual à minha. Coisas do judô.
Por que você demorou tanto para descobrir o verdadeiro caráter dele?
Apesar dos alertas da minha esposa e de várias pessoas, eu sempre saía em defesa dele, inclusive quando ameaçado fisicamente por elementos a quem ele devia dinheiro. Eu não conseguia ver que havia algo errado com ele. Acho que fui ingênuo.
Como ex-professor dele, você sente algum tipo de constrangimento?
Na verdade, ele ficou muito pouco tempo comigo. Mas isso não tem nada a ver, porque o sensei dele é um dos professores mais conceituados e respeitados do nosso Estado. Seu comportamento vem de dentro, ou seja, ele nasceu assim. Como Profissional de Educação Física, certamente aprendeu como deve portar-se ao lidar com o público jovem e infantil que iria atender. A culpa não é minha nem de seus professores, e muito menos da faculdade que ele cursou.
Quando eram amigos, você teve problemas financeiros com o Ibsen?
Vários. Certa vez vendi a ele uma picape, cujo financiamento eu ainda estava pagando. O veículo permaneceu no meu nome e o combinado era que, quando ele acabasse de quitar as prestações, me pagaria o que eu já havia pago antes. Ele não pagou nenhuma parcela, o carro foi apreendido pela financeira e o meu CPF ficou negativado. Além de tudo, o veículo estava cheio de multas. Em outra ocasião, quando ele estava passando por dificuldades, permiti que ele usasse o CNPJ da minha academia para comprar a crédito troféus para um evento. Mais uma vez ele não pagou e eu só descobri quando fui informado que meu CNPJ estava bloqueado.
Há outras más práticas de gestão conhecidas?
Ele foi professor do Colégio Marista por um bom tempo. Num determinado momento a escola precisou de tatamis novos e o autorizou a fazer o pedido. Os tatamis foram comprados e pagos pela escola, mas, para a surpresa de todos, quando ele saiu da instituição levou todos os tatamis embora sem dar a menor satisfação. Você acredita que ele deixará pedra sobre pedra no CREF22/ES?
Ou seja, além da pedofilia ele é desonesto e tem por hábito lesar as pessoas a sua volta!
É um pouco assustador, mas parece que ele não percebe a gravidade de seus atos e das suas atitudes.
“Acho que o comportamento do CONFEF e do CREF22/ES, representa a total desmoralização das entidades.”
Como você avalia a conduta de Ibsen como professor e Profissional de Educação Física?
Para mim ele não é nem um nem outro. A verdadeira essência de um sensei de judô vai além do mero domínio técnico da arte marcial. Um bom professor de judô tem de ser exemplo de conduta moral e ética; deve dedicar-se ao desenvolvimento integral dos alunos, já que cada aluno é único, com habilidades, limitações e objetivos diferentes. Um sensei de judô deve ser capaz de adaptar seu ensino para atender às necessidades individuais de cada aluno, oferecendo orientação personalizada e apoio ao longo de sua jornada no judô, fazendo tudo isso com base numa liderança inspiradora. O Ibsen não vê absolutamente nada além dele, e até hoje só fez denegrir e prejudicar a imagem do judô.
Como presidente do CREF22/ES ele certamente mudou de postura, certo?
Que nada. Recentemente soube que ele foi à Secretaria de Estado de Esportes do Espírito Santo (Sesport) ameaçar um amigo que trabalha lá, professor de aikidô, que havia comentado as denúncias que recaem sobre ele com outros funcionários. Agora, que é o presidente do CREF22/ES, acha que pode intimidar as pessoas e ameaça-las. A sorte dele foi que estava dentro da secretaria. Caso contrário, certamente levaria uma surra.
Como você recebeu a notícia da nomeação de Ibsen pelo CONFEF e o CREF22/ES?
Entendo que tanto o CREF22/ES quanto o CONFEF ignoravam quem e o que, ele é. Imediatamente após tomar conhecimento da sua indicação fiz denúncia às duas autarquias. E, para minha surpresa, essa semana recebi a notícia de que o CREF22/ES fez uma sindicância interna e não encontrou nenhuma irregularidade.
E como você vê essa resposta do CREF22/ES e a falta de reação às denúncias?
Vejo que as diretorias das duas autarquias estão sendo coniventes e compactuando com os crimes cometidos por ele. Acho que o comportamento do CONFEF e do CREF22/ES, representa a total desmoralização das entidades. Ambas as diretorias estão autorizando seus pares a terem esse mesmo tipo de conduta e não serem punidos.
Quais serão os próximos passos para fazer valer a justiça?
Pessoalmente, nada tenho contra ele. Nada do que ele fez contra mim financeiramente me abalou, mas não admito o que ele fez e faz contra jovens e crianças vulneráveis e não vou parar enquanto não o banir definitivamente do judô. Eu quero e vou mostrar as barbaridades que ele pratica e, principalmente, o absurdo que está sendo promovido pelo CONFEF e pelo CREF22/ES, pois ambas as entidades operam com recursos públicos.