18 de novembro de 2025
Consumo como reflexo de valores e emoções © Depositphotos
Em um mundo em que o status se mede pelo que se tem — e não pelo que se é —, pesquisadores eslovacos analisam como a busca por sucesso material, o orgulho nacional e o desejo de consumir se entrelaçam para formar um ciclo de comportamentos que pode levar ao consumo compulsivo. O estudo traz novas perspectivas sobre os efeitos psicológicos e culturais da globalização na formação das identidades de consumo.
Valores materialistas, etnocentrismo do consumidor e compras compulsivas representam três dimensões-chave do comportamento contemporâneo de consumo. Modelos teóricos sugerem que o materialismo — entendido como a valorização excessiva dos bens materiais — pode estimular atitudes de compra impulsiva ou descontrolada, enquanto o etnocentrismo influencia a preferência por produtos nacionais em detrimento de estrangeiros.
O estudo analisou as relações entre esses três fatores em uma amostra representativa de consumidores da Eslováquia, considerando como o contexto sociocultural pós-socialista molda o comportamento de compra. Foram aplicadas escalas padronizadas para mensurar valores materialistas, etnocentrismo e comportamento compulsivo de consumo.
Os resultados indicaram que altos níveis de materialismo estão significativamente associados a uma maior propensão a compras compulsivas. O etnocentrismo apresentou correlação positiva com o materialismo, mas não atuou como mediador direto entre o materialismo e o comportamento de compra compulsiva.
De modo geral, o estudo reforça que as orientações de valor e os fatores culturais desempenham papel central na formação de hábitos de consumo problemáticos, e propõe a incorporação de estratégias de marketing éticas e preventivas voltadas à promoção do consumo consciente.
Em uma sociedade de consumo globalizada e altamente estimulada pela mídia, o desejo de possuir bens materiais tornou-se uma das principais forças motivadoras do comportamento humano. O materialismo, quando exacerbado, é frequentemente associado à queda na satisfação pessoal e ao aumento da compulsão por compras.
A compra compulsiva, por sua vez, é uma forma de vício comportamental caracterizada por impulsos repetitivos de adquirir produtos, mesmo quando isso gera arrependimento ou prejuízo financeiro. Pesquisas anteriores já haviam demonstrado que indivíduos com valores materialistas tendem a buscar no consumo uma forma de compensação emocional — uma tentativa de preencher lacunas de autoestima ou identidade.
Paralelamente, o etnocentrismo do consumidor tem se mostrado um fator relevante nas decisões de compra. Essa atitude — que privilegia produtos nacionais por motivos de identidade e pertencimento — ainda é pouco estudada em sua possível interação com comportamentos de consumo excessivo.
A lacuna teórica que o estudo busca preencher é justamente essa: compreender se o etnocentrismo pode intensificar ou moderar a relação entre materialismo e compra compulsiva. O contexto eslovaco, com sua história recente de transição econômica e forte apego à identidade nacional, foi considerado um terreno fértil para essa investigação.
O estudo baseou-se em três abordagens complementares. A Teoria do Consumo Compensatório (Dittmar, 2005) propõe que o consumo é usado como estratégia emocional para compensar carências psicológicas. A estrutura Valor-Atitude-Comportamento (VAB) explica que valores pessoais moldam atitudes e, consequentemente, comportamentos. Já a Teoria da Cultura do Consumidor (TCC) destaca como o consumo reflete processos de identidade e influência social.
A partir dessas bases, os autores formularam hipóteses que ligam as dimensões do materialismo (felicidade, sucesso e centralidade dos bens materiais) às dimensões do etnocentrismo (afetiva, cognitiva e comportamental), e estas, por sua vez, ao comportamento de compra compulsiva.
Os dados foram coletados junto a 1.000 respondentes eslovacos, entre 18 e 65 anos, em março de 2025. O modelo estatístico utilizado foi a Modelagem de Equações Estruturais (PLS-SEM), uma ferramenta que permite verificar relações complexas entre variáveis psicológicas e culturais.
Os resultados apontaram que o valor materialista “sucesso” — a percepção de que possuir bens define o êxito pessoal — exerce forte influência sobre as dimensões cognitivas e comportamentais do etnocentrismo. Em outras palavras, indivíduos que associam sucesso à posse de bens tendem também a valorizar produtos nacionais como símbolo de status ou identidade coletiva.
Por outro lado, as dimensões felicidade e centralidade dos bens materiais não mostraram relação significativa com o etnocentrismo, sugerindo que o simples prazer de consumir não está necessariamente ligado ao patriotismo econômico.
Quanto às compras compulsivas, observou-se que o etnocentrismo afetivo (orgulho e apego emocional a produtos locais) apresentou relação inversa com o consumo descontrolado — atuando como possível fator de regulação emocional. Já o etnocentrismo cognitivo (crença racional na superioridade dos produtos nacionais) demonstrou correlação positiva com o comportamento compulsivo, indicando que a crença em “comprar o que é da terra” pode, paradoxalmente, incentivar o excesso de consumo.
Outros achados revelaram que os jovens, desempregados e pessoas com alta exposição material na infância apresentaram maiores níveis de consumo compulsivo. Essa observação reforça que tanto a abundância quanto a carência de recursos podem gerar vulnerabilidades comportamentais distintas — uma pela busca de prazer imediato, outra pela necessidade simbólica de compensação.
O estudo confirma que o materialismo continua sendo um dos principais preditores do consumo compulsivo, mesmo em sociedades emergentes ou pós-socialistas. A relação identificada entre o valor de sucesso e o etnocentrismo mostra que o comportamento de compra é profundamente influenciado por elementos culturais, status social e identidade coletiva.
Esses resultados oferecem contribuições teóricas e práticas. Do ponto de vista acadêmico, ampliam o entendimento sobre como valores e atitudes interagem na formação de comportamentos de consumo. Sob a ótica social e econômica, alertam para a necessidade de campanhas de educação para o consumo responsável, voltadas especialmente a grupos vulneráveis como jovens adultos e consumidores em transição de renda.
O trabalho também sugere que as marcas nacionais podem — e devem — incorporar políticas de marketing ético, evitando explorar o orgulho nacional como instrumento de estímulo ao consumo impulsivo.
Os autores declaram que receberam apoio financeiro para a pesquisa e/ou publicação deste artigo. Este trabalho foi financiado pela Agência Eslovaca de Pesquisa e Desenvolvimento, sob o contrato № APVV-23-0472.
Os autores declaram que a pesquisa foi conduzida na ausência de quaisquer relações comerciais ou financeiras que possam ser interpretadas como um potencial conflito de interesses.
Róbert Štefko¹†, Martin Rigelský¹†, Ivana Ondrijovᲆ* e Lenka KráľovṆ
¹ Department of Marketing and International Trade, Faculty of Management and Business, University of Presov, Prešov, Slovakia
² Department of Managerial Psychology, Faculty of Management and Business, University of Presov, Prešov, Slovakia
Explorando a relação entre materialismo, etnocentrismo do consumidor e compras compulsivas: Frontiers in Psychology.
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